Em memória
Hoje perdemos (mas apenas fisicamente) o maior pilar de nossa família. Minha avó Maria descansou.
Mãe solteira na década de 1950, veio escapada do Manduri, após sofrer com violências e julgamentos, construir uma vida em Curitiba. Filha de uma holandesa doce e de um polonês idealista, que variou do comunismo para o testemunho de Jeová, construiu seu próprio caminho, na dureza e na alegria de seus próprios ensinamentos.
Conheceu outro migrante solitário, que tinha vindo do nordeste do país num pau de arara, e com ele constituiu família, e com ele desafiou preconceitos de parentes e de toda uma sociedade.
Construíram uma casa de madeira, ao lado de uma valeta, na periferia de Curitiba. Meu avô achava chique morar ao lado de um rio. Mas esse rio alagou tantas vezes — eu mesmo lembro da casa cheia de lama quando era pequeno —, trazendo sempre alguma pequena ou grande tragédia. Foram décadas de reconstrução da própria casa contra os desígnios do mundo.
Eles lutaram muito juntos, batalharam enquanto puderam pra cuidar dessa família que resultou do encontro de dois solitários, que migravam com sonhos que não cabiam em seus rincões de origem. Viajaram muito, nos criaram e nos deram valores, sempre estiveram pra cada um de nós, nos momentos mais difíceis e nos mais alegres.
Até nesse momento derradeiro, tão doloroso, parece que minha avó queria cuidar da gente, desligando bem lentamente, como que fazendo a gente acostumar, nessas duas semanas, com a inevitável ausência que nos causaria. Ainda assim, dói tanto, minha vózinha. Vou sentir tanta falta tua.
Agora, como uma espécie de epílogo da tua vida, levo teus olhos verde-acinzentados por trás do meus, me guiando, para sempre.
Homenagens
Enviou flores.